Você já ouviu falar em CHEMSEX?

Autoimagem, LGBTfobia Internalizada e o Impacto do Chemsex na Saúde Mental

 “Também há os que usam das drogas para se sentirem mais confiantes na hora H. Sentem-se inseguros em relação a seus corpos (e sabemos que isso é bastante comum dentro da comunidade, como já explorado nesse outro texto que escrevi), ao julgamento dos parceiros sobre eles e também em relação à sua performance sexual (‘se eu não uso a droga, eu fico com vergonha do meu corpo, doutor’) e, no chemsex, acham uma maneira de diminuir essas preocupações.” (Branquinho, 2020)

A baixa autoestima entre homens gays tem raízes profundas, influenciadas por fatores biopsicossociais, nos quais indivíduos LGBTQIAPN+ frequentemente enfrentam discriminação, descrédito e rejeição em diversos contextos, como familiar, escolar e profissional. Além disso, a LGBTfobia, tabus sobre práticas sexuais e preconceitos tanto da sociedade quanto da própria comunidade LGBTQIAPN+ impactam negativamente a autoimagem, levando alguns a recorrer ao uso de substâncias como forma de lidar com o sofrimento emocional.

Embora as drogas possam proporcionar um alívio temporário, seu uso prolongado frequentemente agrava problemas de saúde física e mental. No fenômeno do chemsex — uso de substâncias psicoativas para intensificar experiências sexuais — muitos encontram uma válvula de escape para inseguranças relacionadas à autoimagem e ao desempenho sexual. Esse comportamento pode estar atrelado à LGBTfobia internalizada, onde o indivíduo absorve os preconceitos sociais e passa a sentir vergonha ou desconforto com sua própria identidade.

Padrões de Beleza e Pressão Social

A construção da identidade corporal entre homens gays e bissexuais é fortemente influenciada por padrões de beleza impostos pela sociedade e reforçados pela mídia e redes sociais. Corpos musculosos e esbeltos são frequentemente glorificados, criando uma pressão intensa para atender a esses padrões muitas vezes inatingíveis. Dentro da própria comunidade LGBTQIAPN+, subculturas valorizam certos tipos físicos, o que pode reforçar a exclusão e a baixa autoestima daqueles que não se encaixam nesses ideais.

Judith Butler, em Bodies That Matter: On the Discursive Limits of Sex(1993), discute a performatividade dos corpos e como a construção social da materialidade influencia a percepção de gênero e sexualidade. Corpos musculosos e definidos são, muitas vezes, materializações de normas sociais que reforçam ideais de masculinidade e atratividade. Essa imposição de padrões pode levar a transtornos de imagem corporal, dismorfia e até ao uso de substâncias como esteroides anabolizantes na tentativa de alcançar uma aparência desejada.

Consequências para a Saúde Mental e Bem-Estar

A constante comparação com padrões irreais pode gerar um impacto significativo na saúde mental, levando a distúrbios alimentares, depressão e ansiedade. Além disso, o uso de drogas como forma de lidar com inseguranças pode resultar em dependência química, comprometendo ainda mais o bem-estar emocional e físico dos indivíduos.

A LGBTfobia internalizada também contribui para dificuldades nos relacionamentos interpessoais. Muitos homens gays que sofrem desse fenômeno têm dificuldades em se relacionar sem o uso de substâncias, pois estas atuam como mediadoras do medo da rejeição e da vergonha associada à própria identidade.

Estratégias para Romper o Ciclo

Para combater esses desafios, é essencial investir em estratégias que promovam a autoaceitação e a ressignificação da autoimagem. Algumas abordagens incluem:

– Psicoterapia afirmativa: Terapias que validam a identidade LGBTQIAPN+ ajudam no processo de ressignificação e enfrentamento da LGBTfobia internalizada.

– Grupos de apoio: Espaços seguros onde indivíduos possam compartilhar experiências e construir redes de suporte são fundamentais para fortalecer a autoestima.

– Educação e representatividade: Campanhas que promovam corpos diversos e desconstruam padrões irreais de beleza ajudam a reduzir a pressão estética e seus impactos negativos.

– Promoção da saúde mental e bem-estar: Incentivo à prática de atividades físicas por bem-estar e não apenas estética, além de políticas públicas que garantam direitos e proteção contra a discriminação.

Conclusão

O impacto do chemsex, da pressão estética e da LGBTfobia internalizada na saúde mental de homens gays e bissexuais é um problema complexo e multifatorial. Para promover uma comunidade mais acolhedora e inclusiva, é fundamental desconstruir padrões opressivos, ampliar o acesso a suporte psicológico e criar ambientes onde todos possam se sentir valorizados e respeitados por quem são. 

Referências

BRANQUINHO, Bruno. *Por que o sexo com drogas é tão presente entre os homens gays e bissexuais?* Carta Capital, 2020. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/blogs/saudelgbt/por-que-o-sexo-com-drogas-e-tao-presente-entre-os-homens-gays-e-bissexuais/. Acesso em: 28 mar. 2024.

BUTLER, Judith. *Corpos que pesam: sobre os limites discursivos do “sexo”*. Tradução de Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2019.