Despatologização da Transexualidade: Desafios e Caminhos para um Acesso Digno à Saúde

“Arán, Murta e Lionço (2009) fazem uma análise crítica do Processo Transexualizador e pontuam que, mesmo considerando os inegáveis benefícios que alguns serviços têm prestado a usuários transexuais, vale destacar que a exigência do diagnóstico como condição de acesso ao tratamento vem sendo continuamente problematizada, por meio das contribuições realizadas no campo da saúde coletiva, das ciências sociais e da bioética.”

No Brasil, a exigência de um diagnóstico de transtorno de identidade de gênero para o acesso ao processo transexualizador tem sido um tema amplamente debatido. Essa exigência, ainda vigente, afeta diretamente pessoas trans que buscam terapia hormonal e cirurgias de redesignação sexual pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Embora o diagnóstico de incongruência de gênero (conforme a CID-11) seja considerado um critério médico, sua imposição reforça a patologização da transexualidade e cria barreiras para o acesso a cuidados adequados.

O Problema da Patologização

A comunidade LGBTQIAPN+, ativistas de direitos humanos e defensores dos direitos trans criticam a necessidade de um diagnóstico psiquiátrico para validar a identidade de gênero. Esse requisito perpetua a ideia de que a transexualidade é um distúrbio a ser corrigido, em vez de uma expressão legítima da diversidade humana. Além disso, a burocracia e a escassez de profissionais capacitados dificultam ainda mais o acesso aos serviços de saúde para pessoas trans.

Para muitas pessoas trans, a obtenção de um diagnóstico representa um processo longo e desgastante, marcado por estigmas e preconceitos. A falta de capacitação de profissionais de saúde, somada à desinformação e a barreiras políticas, cria um ambiente hostil e excludente. Em muitos casos, a identidade de gênero autodeclarada não é respeitada, dificultando ainda mais o acesso a tratamentos essenciais.

A Revisão da Portaria nº 457/2008 e o Caminho para a Despatologização

Atualmente, a Portaria nº 457/2008 do Ministério da Saúde, que regula o processo transexualizador no SUS, está em processo de revisão. O objetivo é garantir que pessoas trans possam acessar tratamentos sem a necessidade de um diagnóstico de transtorno mental, promovendo um modelo baseado no respeito à autodeterminação de gênero.

A revisão dessa norma representa um avanço significativo na promoção da dignidade e autonomia das pessoas trans no Brasil. A despatologização da transexualidade é uma demanda urgente, que exige a atuação de autoridades de saúde, profissionais, ativistas e da comunidade LGBTQIAPN+ para garantir o acesso igualitário e respeitoso aos cuidados médicos.

Conclusão

A despatologização do processo transexualizador é um passo fundamental para garantir a inclusão e o respeito às identidades de gênero no sistema de saúde. Para isso, é essencial eliminar a exigência do diagnóstico psiquiátrico, capacitar profissionais e garantir que o SUS seja um espaço de acolhimento e cuidado digno para todas as pessoas trans. A luta por um acesso mais justo e humanizado à saúde continua sendo um compromisso necessário para a construção de uma sociedade mais igualitária.

Referências

ARÁN, M., MURTA, D., LIONÇO, T. *Transexualidade e saúde pública no Brasil.* Ciência & Saúde Coletiva, v. 14, n. 4, p.1141-1149, 2009.